Nossa Era de Ouro é agora

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Feriado é bom porque podemos passar da hora de dormir vendo filmes. Ontem, no Netflix, assisti Midnight in Paris (2011), do genial Woody Allen. Foi sugestão do B. e eu não sabia bem o que esperar. Mas, sabendo ser Woody Allen, fiquei tranquila – pessoalmente, todos os filmes dele que vi, terminei mexida. E “ói nóis aqui traveis”.

Midnight in Paris, além de explorar o cenário maravilhoso da cidade, conta a história de um roteirista bem sucedido que quer aventurar-se na literatura – and don’t we all? – e tem como tema de seu romance, a nostalgia. Claro que a moça com a qual ele vai ser casar acha isso uma bobagem. Claro que a futura sogra é uma pessoa materialista e ligada ao que pode ser comprado em Paris e não tem na sua cidade natal. Claro que o futuro sogro é um republicano pragmático. E ele? Ele é um artista… um sujeito que enxerga em Paris e nos anos 20 uma Época de Ouro. Pois que, uma meia-noite, um velho Pegeout passa com ninguém menos que Scott Fitzgerald dentro – morri!

E em seus passeios e encontros, conhece Picasso, Hemingway, Stein, Man Guy e outras figuras importantes do Modernismo… EU vibrava com isso… como quase um sonho meu na tela, refletido. E compreendi aquela personagem: um lugar de sonho em uma época que seria um sonho… um burburinho… o movimento… o pensamento…

E daí, vem o primeiro tapa do filme. A ideia de que, os anos 20, era a realidade e a contemporaneidade daquelas pessoas… “Aqui é o presente… e o presente é chato”.

Acho que muitas pessoas sentem essas nostalgias e têm esse entendimento de que algum lugar no passado seria um tempo melhor para se viver. E fico imaginando se, daqui algumas gerações, pessoas dirão: que momento excitante a década de 10, do séc. XXI. Por que temos esse entendimento de que as coisas eram melhores, mais simples, melhores de se viver? Quantas coisas aconteciam como agora e que não vemos as dificuldades? Talvez o passado seja um estereótipo de tempo – e como todos os esteriótipos, incompleto. Penso também que saber o que vai acontecer em um determinado momento da História nos dê mais segurança do que o nosso próprio: não sabemos o que vai acontecer amanhã, mês que vem, a seguir.

No entanto, o que nos sobra? Hoje. Agora. E por estar desenrolando a História agora não temos uma visão completa do que é o nosso tempo. Assim, não podemos contemplar com amplitude o que está se dando à nossa volta. Porém, não temos o passado. O futuro ainda não chegou. Sobra agora… fazer do agora o melhor que podemos. E quiçá, um dia, olhar para trás com um naco de saudade… Mas querendo fazer o melhor. Agora.

Pietra

Inteira

Já comentei que a ideia de simplicidade e intenção na vida não são fáceis? Acho que nas últimas postagens isso tudo tem ficado claro. Como tem ficado para mim no dia a dia. Quero dizer, sempre meio que foi, mas era uma coisa apenas do meu trabalho: eu sempre dizia a outras professoras que se sabemos o que estamos fazendo, não tem historieta alheia que interfira. 

Oras bolas, se é tão certo assim, por que não para toda a vida – afinal de contas, ela não é só trabalho… Aliás, isso deveria ser apenas uma pequena parte dela. 

Muito bem. Ser intencional e ter intencionalidade com as coisas, com a vida é um trabalho brutal. Facilita. Simplifica. No entanto, exige uma clareza mental imensa. 

Isso tudo quer dizer que precisamos saber o que estamos fazendo e, principalmente, o por quê. 

Começar não é difícil, mas pede uma auto-análise. Quem você é? Quais são seus princípios, ou seja, onde quer chegar? Quais são suas crenças, ou seja, quais são os caminhos para chegar? Em cima de tudo isso, coisas começam e param de fazer sentido. 

Assim, nunca deixe de se perguntar: por que estou fazendo isto? Vai de encontro com meus valores, meus princípios? 

E vale para tudo: da comida que se come, aos livros que se lê… Ressona em personagens que encontramos em histórias. Já me encontrei nos livros de José Saramago tantas vezes… A mulher do médico, Blimunda, Maria Madalena. Percebi o sentido de futuro de Willian Stoner. Vivo com meus ideias espirituais como Shadow, em Deuses Americanos. 

Hoje, encontrei Ricardo Reis nometrô. Mexeu comigo. Ser inteira é compreender o sentido do que está fazendo ou pensando. Todos os passos ganham, de fato, a sua pegada. Pode ser que isso não mude em nada o mundo à nossa volta. Mas, muda o mundo à nossa volta. 


Ser inteira e intencional é encontrar a sua medida no mundo. Isso, claro, passa por testes e ajustes… Afinal é uma construção para sermos o nosso melhor. Todos os dias. Não ser perfeita. Mas, a melhor possível. 

Nada na vida é perene. Nós não somos. Mas, porque não perceber e atuar no nosso mundinho com as mãos mais significativas? Dar valor ao que realmente é importante? 

Tem tanta gente no mundo. Atuar entre tantas outras pessoas não nos faz especiais. Mas e daí? Eu quero ser autêntica. O resto, vem por consequência. 

Pietra 

Por que algo que trazia alegria vira fonte de enfado?

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Esta é uma reflexão que venho fazendo faz semanas e talvez hoje, fazendo coisas realmente significativas, tenha chegado a algumas conclusões.

É muito curioso como podemos começar um projeto, um relacionamento ou mesmo um trabalho com um gás incrível, um verdadeiro senso de propósito para aquilo e, ao longo do tempo, passar a se perguntar: (insira aqui divindade de preferência) o que eu estou fazendo aqui? Você se sente perdendo seu bem mais precioso: seu tempo; gastando energia à toa e com a cabeça no que realmente faria mais sentido estar desenvolvendo. O complicado é quando isso tem a ver com as suas relações próximas ou com a sua fonte de sustento.

Antes de tudo, eu quero crer que faço um trabalho ou estou com uma pessoa – seja por qual tipo de relação seja – por gosto. Evidentemente sabemos que não existe um trabalho perfeito ou relacionamento perfeito… afinal de contas, ele envolve outras pessoas e lidar com a raça humana pode ser muito desafiador. Pessoas pensam e agem de formas diferentes, você inclusive, pode ser o vilão de determinadas situações na perspectiva do outro.

Pois bem… existem dissabores que não podemos evitar. Fato. Mas, como lidamos quando os dissabores sobem nos sabores e o que estamos fazendo torna-se uma fonte de enfado?

Talvez, uma das primeiras coisas é pensar as suas expectativas. Infelizmente a pior punição para o crime de expectativa é o vácuo. Por observar circunstâncias ou ouvir palavras, podemos acreditar que algo X ou Y vai acontecer. E na hora H, não acontece. E a única pessoa que sai chateada com isso é você. Assim, como diz minha sábia mãe, não conte com o ovo no * da galinha.

Depois, o verdadeiro significado que ela tem na sua vida. Existem paixões tão grandes em nossas vidas que, se transformadas em uma fonte de contribuição e até de sustento, viram nossa missão e viver isso é incrível. No entanto, elas passam por detalhes e tecnicalidades que pouco têm a ver com a natureza do que se está fazendo. Qual é o peso que uma coisa tem na outra? É um peso importante a ser feito.

Ainda, vale a pena pensar nas urgências e importâncias das coisas. Será que damos, realmente, a importância que as coisas têm? Quantos incêndios passamos o dia apagando quando existem brasas que consomem o nosso trabalho e podem estar minando o significado que elas têm?

Simplificar. Simplificar. Simplificar. Caso contrário, tudo a sua volta, torna-se desperdício de tempo, recursos e energia. É um péssimo sentimento para se ter =(

Empatia e reconhecimento. Pode ser que se trate de um sentimento efêmero e temporário. Mas o que na vida não é? A questão é que o entendimento exterior do que estamos fazendo ou talvez de um mínimo apoio no que desenvolvemos devolve uma certa frescura aos procedimentos e sentido ao que estamos fazendo. Além disso, fazer o que gostamos de fazer recebendo apenas críticas pelos detalhes que não se relacionam com o core da praxis é extremamente desestimulante? E faz pensar sobre o valor que o trabalho tem realmente…

Eu sei que deveríamos ser seguros com o que fazemos e com o que acreditamos. Acredito também que existem desafios imensos quando se resolve lidar com algo que não seja mainstream ou que têm um significado para nós que não é compreendido por quem está em volta. É uma chance de reafirmar crenças e valores. No entanto, o quanto disso se aguenta?

Eu tenho notado um ciclo nisso. De namoro com determinadas relações e posteriores decepções imensas. Nem tudo pode ser como queremos… a questão é que, uma vez que se passa a refletir sobre o que acontece e não simplesmente aceitar – que talvez fosse o caminho mais fácil, mas o menos significativo – ter uma vida intencional ou simples passa a ser muito difícil. Não é um convite a desistir. Mas, a repensar. O que está levando a este imenso ir e vir de alegrias e decepções? Talvez a segurança de lidar com o que sempre soubemos seja tóxico, pois sabemos onde as coisas terminam. No entanto, insistimos. E temos medo de buscar uma terceira via.

Pessoalmente, hoje, eu ainda não vejo uma terceira via. Vejo uma segunda via e meia. Se as exigências da nossa realidade nos tomam nosso precioso tempo, como suavizar e, de fato, se programar para entrar na terceira via?

Faz uns meses que eu estou pensando sobre isso. E me esforçando para não buscar em outro lugar exatamente o que eu estou vivendo agora e que me desagrada. Não adianta uma casca diferente, mas com o mesmo sabor de insatisfação.

Simplificar. Simplificar. Simplificar. Quiçá, correndo por esse viés, eu consiga me livrar do peso das minhas expectativas e das atuais âncoras que pesam tanto.

Qual é a sua terceira via? Ela é viável?

Pietra

Papo reto com o primeiro ano


Tive uma conversa direta e honesta com meus alunos do primeiro ano hoje. Eles têm 6 anos. E não gostam de ser tratados como bobos ou inocentes – na pior acepção da palavra. Eles perguntam porque, de fato, querem saber e quiçá confiam em mim. 

E. me perguntou, informalmente, se, a medida que a gente cresce, os professores que temos vão ficando “mais bravos”. Logo imaginei que vinha uma puxada de orelha deles em mim. Que nada! Ele me disse que sua mãe lhe contou que “uma vez ela estava com dor na barriga – ela já era grande – e o professor dela não deu a mínima”. 

Entendi o “bravo”. Distante. Desinteressado. Sem querer, estamos em uma roda conversando sobre como a vida passa e o olhar das pessoas muda sobre nós. 

Disse ao grupo que, conforme crescemos, os professores se tornam muitos e o entendimento que temos sobre eles – e eles, sobre nós – também muda. 

Contei a eles que na faculdade temos muitos professores que podem nos inspirar muito sobre o trabalho que decidimos fazer na vida, mas que eles confiam que já sabemos fazer coisas sozinhos. A tutela diminui brutalmente. E que, se eu pego no pé deles hoje – e pego meeeeesmo – é para garantir que eles sejam independentes e que saibam, cada vez mais, cuidar de si e dos seus estudos.

Curioso, E. me perguntou se esses professores também permitem que brinquem. Eu disse que talvez, mas a rotina escolar muda. Como mudou a medida com que eles avançaram da Educação Infantil para o Ensino Fundamental. Ele fez uma cara um tanto tristonha. “Eu não quero fazer faculdade, então. Para não ter que trabalhar”, concluiu. 

“Bem, E., então de onde virá o dinheiro para você poder comer, por exemplo? Todos trabalham, numa coisa ou outra, para se sustentar”, rebati. 

Então começou uma discussão sobre o que gostariam de fazer. Até que chegamos na faculdade de música, a qual deixou E. encantado. 

“Mas, não se engane. É um estudo que exige dedicação. Tudo de trabalho dá trabalho. Pensem. Vocês são o meu trabalho. Acham que eu gosto de estar aqui?”, perguntei. 

Uma disse não. A que foi interpelada: “claro que ela gosta. Senão já tinha ido embora. Você está aqui nessa escola por nossa causa, não é?”, outra E. pergunta. 

“Claro! Sem vocês não tenho trabalho e não posso fazer uma coisa que eu amo… Ensinar.”

Outros pequenos assuntos entraram no meio, mas terminei dizendo a eles, bem baixinho: “vou contar um segredo para vocês. Serve para a vida toda!”

E se abaixaram para ouvir a confidência, o pulo do gato: “quando vocês descobrirem o que gostam de fazer, não parece trabalho. Você nem sente que está trabalhando”. 

É possível que isso só faça sentido daqui um tempo. Ou que eles esqueçam disso, dessa conversa toda. Não importa. O que interessa é que, em 67 dias letivos, nos quais me dedico a avançar a leitura, a escrita deles, eu tenha, minimamente, ampliado a visão e o que entendimento de mundo deles. Pois é para esse mundo, deles e meu, que dedico as minhas horas.

Quem sabe o Ensino Fundamental seja para esses fundamentos da vida?

Pietra 

A viuvez

Há 3 anos, eu me tornei viúva. Quem me dera fosse uma bad ass como a Viúva Negra. Eu fui viúva de marido vivo. E talvez isso fosse a coisa mais dolorida de ser. Eu não comia. Eu bebia razoavelmente. Eu chorava lágrimas de chumbo. Mas… o tempo, claro, fez seu trabalho.

Hoje, eu agradeço imensamente pelo ocorrido. Não perdoei, é verdade. E o tempo talvez será juiz disso… Mas, a questão é que desta morte coisas ótimas aconteceram.

Pode ser sim que eu tenha apodrecido um pouco na época. No entanto, esse apodrecimento foi combustível de coisas ótimas. Contrariando tendências, eu não me tornei uma pessoa amarga… Eu aprendi a viver. E com isso, apreciar os bons momentos e valorizar o que a vida e o tempo têm a oferecer.

De lá pra cá, houveram desmaios e uma outra morte. Sem envolver terceiros. Minha mesmo. E sempre e tanto, a morte tem tanto para mostrar. Quantas coisas para enterrar e não voltar mais ao túmulo. No entanto, a lembrança do estado moribundo, que não precisa ser um pesar, acaba por se tornar um estímulo. Para abrir os olhos a cada manhã e sorrir pelas coisas ótimas que despontam até nos dias mais improváveis.

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A morte nos pergunta: “Quem é você?”

E podemos ser Alice e responder: “Eu não sei bem (…) já mudei tantas vezes desde hoje de manhã…”

Mudemos, pois. Morremos, talvez, todos os dias, para um próximo. E abrimos os olhos para uma nova vida que desponta com o nascer do sol. Que bom!

Pietra